Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Ás do volante na ultrapassagem de obstáculos, o
ex-presidente Luiz Inácio da Silva agora está diante de um quase
intransponível: a abertura de inquérito policial para investigar as denúncias
feitas por Marcos Valério Fernandes de Souza à Procuradoria-Geral da República,
apontando Lula como ator principal do mensalão.Se o operador do esquema disse a verdade ou se mentiu não
é algo que possa ser revolvido com negativas, tentativas de desacreditar o
acusador ou acusações sobre conspirações de natureza política.Inclusive porque a história está muito mais
"amarrada" do que deixam transparecer o Ministério Público e o
Supremo Tribunal Federal. Roberto Gurgel tomou outro depoimento de Marcos
Valério além daquele revelado ontem pelo Estado.No curso do julgamento, o STF fez reuniões
administrativas ainda sob a presidência de Carlos Ayres Britto para tratar do
assunto.Ficou acertado o início do processo de negociação da
delação premiada, mas mantido em sigilo para impedir que novos fatos
interferissem no julgamento em curso e que agora está na fase de conclusão.A depender da qualidade das informações que venha a
fornecer, Marcos Valério terá benefícios nos processos relativos ao mensalão em
tramitação na primeira instância e em novos que venham a ser abertos.Mas é possível que obtenha do relator Joaquim Barbosa um
regime especial de prisão (cela isolada ou na companhia de preso com curso
superior, acesso facilitado a visitas, direito a livros e televisão) na hora da
definição da execução da pena.Não por acaso esse assunto foi ventilado há poucos dias
no STF. A forma de cumprimento das sentenças ficará a cargo de Barbosa e não de
juiz de vara de execuções.Embora Valério não seja visto como testemunha confiável,
seu melhor ou pior destino está atrelado às provas que possa apresentar. Ele
mentiu muito, prometeu demais, entregou quase nada e agora sua única chance de
salvar em parte a pele é falar a verdade.Por que não falou antes? Primeiro porque o advogado dele
era contra o recurso da delação e, segundo, porque percebeu tarde que a rede de
proteção prometida pelo PT não existia.Condenado a 40 anos e com a perspectiva de passar o resto
da vida na cadeia devido aos outros processos, a única opção era tentar reduzir
os danos. Como o mensalão propriamente dito já estava desvendado, de novidade
relevante só o papel de Lula.Agora o Ministério Público tem dois caminhos: arquivar o
caso ou pedir ao Supremo que determine abertura de investigação.Para arquivar, no entanto, é preciso que não reste dúvida
sobre a existência de indícios de que houve crime. E os vestígios estão
presentes em pelo menos um dos episódios narrados por Marcos Valério.É o caso do depósito de "cerca de R$ 100 mil"
na conta da empresa Caso, segundo Valério, para pagar despesas pessoais do
então presidente da República.Na quebra de sigilo ordenada pela CPI dos Correios, em
2005, aparece o registro de R$ 98.500 depositados na firma de propriedade de
Freud Godoy assessor direto de Lula, coordenador de segurança de suas quatro
campanhas presidenciais e até 2006 com sala no Palácio do Planalto.Um personagem complicado, obrigado a se demitir quando
foi apontado por um dos "aloprados" presos com dinheiro para compra
de dossiê contra adversários políticos como o mandante do negócio.Esse e outros relatos de Marcos Valério por si acionam os
botões da engrenagem investigativa que, como uma máquina quando ligada,
funciona à revelia das vontades.
Lula poderá de novo alegar que não sabia de nada?
Poderá, mas desta vez há personagens notórios demais, detalhes verossímeis demais e um arsenal imponderável demais nas mãos de um homem que, além de não ter nada a perder, não esquece os maus bocados vividos em experiência traumática na cadeia.
Banco do Brasil arrecadava 'pedágio' para
o PT, afirma Marcos ValérioEmpresário relatou que 2% do valor destinado a agências de publicidade seria direcionado para contas do partido
12 de dezembro de 2012 | 1h 00Lula poderá de novo alegar que não sabia de nada?
Poderá, mas desta vez há personagens notórios demais, detalhes verossímeis demais e um arsenal imponderável demais nas mãos de um homem que, além de não ter nada a perder, não esquece os maus bocados vividos em experiência traumática na cadeia.
Banco do Brasil arrecadava 'pedágio' para
o PT, afirma Marcos ValérioEmpresário relatou que 2% do valor destinado a agências de publicidade seria direcionado para contas do partido
Felipe
Recondo, Alana Rizzo e Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza
afirmou no depoimento prestado em 24 de setembro à Procuradoria-Geral da
República que dirigentes do Banco do Brasil estipularam, a partir de 2003, uma
espécie de “pedágio” às agências de publicidade que prestavam serviços para a
instituição financeira pública: 2% de todos os contratos eram enviados para o
caixa do PT, acusou o homem apontado como o operador do mensalão pelo Supremo
Tribunal Federal.
Em dois anos, os repasses do Banco do Brasil às cinco
agências de publicidade com quem mantinha contrato superaram R$ 400 milhões -
uma delas era a DNA Propaganda, de Valério. Ou seja, segundo o empresário disse
à Procuradoria-Geral da República em setembro, os desvios que abasteceram o
mensalão podem ter sido bem maiores do que os que levaram o Supremo Tribunal
Federal a condenar Valério e o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique
Pizzolato.Segundo os ministros da Corte, R$ 2,9 milhões foram
desviados do contrato da DNA com o Banco do Brasil para o mensalão. Outros R$
74 milhões foram desviados do contrato da DNA com o Fundo Visanet, do qual a
instituição financeira pública fazia parte.
Contexto. O Estado revelou nesta terça-feira,
11, que, neste mesmo depoimento de três horas e meia,
dado à subprocuradora da República Cláudia Sampaio e à procuradora da República
Raquel Branquinho, o empresário mineiro afirmou que dinheiro do esquema que
pagou parlamentares do Congresso Nacional entre 2003 e 2005 também serviu para
bancar “despesas pessoais” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O
dinheiro foi depositado, disse Valério, na conta de uma empresa de Freud Godoy,
que foi assessor pessoal de Lula.
O empresário mineiro afirmou ainda, entre uma série de novas acusações, que o ex-presidente deu “ok” para os empréstimos com os bancos BMG e Rural que viriam a irrigar o mensalão.
Na ocasião do depoimento, o empresário mineiro, além de fazer novas revelações, afirmou que ainda tinha mais a dizer sobre o caso. Queria, em troca, proteção e redução da sua pena - ele viria a ser condenado a mais de 40 anos pelo Supremo por sua participação no mensalão; Valério responde ainda a outros processos, como o do mensalão mineiro, no qual políticos são acusados de desviar dinheiro público do governo de Minas Gerais a fim de abastecer, no ano de 1998, a campanha à reeleição do então governador tucano Eduardo Azeredo, ex-presidente nacional do PSDB e hoje deputado federal.
Segundo Valério disse no depoimento, o suposto esquema de
desvio de dinheiro público que teria de ir para a publicidade foi criado por
Pizzolato e Ivan Guimarães, ex-presidente do Banco Popular do Brasil, que
integra a estrutura do Banco do Brasil.O ex-diretor do Banco do Brasil negou nesta terça-feira
que tenha cobrado “pedágio” das agências de publicidade. Guimarães não foi
localizado pela reportagem.Participação. No
período de operação plena do mensalão, entre 2003 a 2004, quando uma série de
parlamentares fez saques das contas das empresas de Valério, o Banco do Brasil
pagou, segundo dados CPI dos Correios, pelo menos R$ 434 milhões a agências de
publicidade. Ao longo desse período de dois anos, a agência DNA, uma das
empresa de Valério que detinha um dos contratos com o Banco do Brasil, aumentou
sua participação nos acordos enquanto o bolo recebido pelas demais agências
declinava aos poucos.Ainda no primeiro ano de governo do ex-presidente Lula,
em 2003, a DNA, que já trabalhava com o Banco do Brasil durante o governo do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, conseguiu renovar o contrato com a
instituição financeira pública.Renovações. O
valor estimado dos gastos anuais de publicidade com a DNA era de R$ 152,8
milhões, segundo informações do Ministério Público Federal. A renovação teria
rendido a Pizzolato mais de R$ 300 mil de contrapartida, segundo dados usados
pelos ministros do Supremo para condenar o ex-diretor do banco corrupção
passiva, lavagem de dinheiro e peculato, com pena de 12 anos e sete meses de
prisão.Além da DNA, a licitação 01/2003 originou contratos com a
Ogilvy Brasil Comunicação Ltda e a D+Brasil Comunicação Total. Já havia
contratos em andamento desde 2002 com as agências Grottera Comunicação e Lowe
Lintas Partners , que continuaram a ser prorrogados a partir de 2003, início do
governo Lula.Abrangência. Os
contratos firmados em setembro de 2003 entre o Banco do Brasil e as cinco
agências alcançavam todo o conglomerado do Banco do Brasil, incluindo empresas
ou entidades que fossem criadas e a Fundação Banco do Brasil.Comandado por Ivan Guimarães, o Banco Popular do Brasil
funcionava como uma subsidiária integral, cuja autorização de funcionamento foi
publicada em dezembro de 2003. Guimarães também esteve envolvido no episódio da
compra do apartamento da ex-mulher de José Dirceu por Rogério Tolentino, sócio de
Marcos Valério.
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